Em época de eleição, com a propaganda eleitoral a todo vapor, comícios, debates e visitas dos candidatos, não tem como não falar de política no blog. Eu, particularmente, sou adepta da idéia de que temos que ter o máximo de informações possíveis para tomar uma decisão que não é pequena e não é fácil. Não é fácil, neste país de surpresas, dizer o que vai e o que não vai dar certo. Por exemplo, o Plano Real, brilhantemente concebido e executado. O Plano Real não é só um exemplo de que existem economistas, políticos e estudiosos competentes no país, mas também é uma demonstração de que o Brasil tem jeito sim e pode dar certo. Como dizem por aí, é só saber aproveitar a hora certa.
Há algumas semanas, eu lia a revista Época e me deparei com uma entrevista com o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso. Na entrevista, FHC reforça a idéia de que é mais do que necessário fazer uma reforma política, mas teme que a mesma somente aconteça em situação de crise, como foi com o Plano Real. "O Plano Real só funcionou porque estávamos em crise. Na crise, você tem espaço se tiver liderança." Se não houver convergência de governo e oposição em torno da reforma política, diz o ex-presidente, o risco é haver uma cisão política no país. "Quando se divide um país, leva muito tempo para restabelecê-lo", afirma FHC. A reforma seria, portanto, o principal desafio do próximo presidente, seja ele de qual partido for.
A revista questiona o ex-presidente dizendo que a base do governo atual e do anterior é muito parecida, ao que FHC responde: "O Luiz Werneck Viana (cientista político) disse que o problema do Brasil é saber quem comanda o atraso: PT ou PSDB. Mas agora quem está no comando é o próprio atraso. O problema deste governo não foi a base. A base é a mesma. Só que o Lula não manda nada. Para comandar, você precisa saber para onde vai. Mas a sensação é que eles não sabem. O projeto deles é o nosso. Talvez nem haja outro, porque a História não tem projeto novo a todo momento. Mas então que eles assumam e parem de ficar fingindo que é herança maldita. Claro que, se o Lula for eleito, a eleição dá energia política. Mas o Lula não tem paciência para esse jogo. Lula mais conversa com o país que administra ou faz política. Ele é mais simbólico que efetivo. E, se exagerar muito no simbólico, fica sem comando. "
A Reforma Política sem dúvida é polêmica. Para fazê-la, precisamos responder a uma série de questões: quando fazê-la? Quem vai comandá-la? Como fazê-la? Fernando Henrique tentou responder a última pergunta da seguinte maneira: "Reforma política é reforma do sistema eleitoral. Tem de botar o voto distrital no Brasil, porque precisa haver uma relação mais próxima do eleito com o eleitorado. Hoje, não há nenhuma. Quem vota não sabe em quem votou e quem foi eleito não sabe por quem foi votado. Falam em instituir o sistema do recall no Brasil (o mecanismo americano por meio do qual os eleitores podem cancelar um mandato e convocar novas eleições). Mas como? Recall só pode existir quando um distrito que votou no candidato não o quer mais. No Brasil, ninguém sabe em quem votou. É preciso buscar uma forma de identificação, de laço. Eu era favorável ao voto distrital misto. Agora quero o voto distrital puro. O misto se justificava por causa das minorias, como os partidos comunistas e os verdes. Mas esses partidos vão desaparecer com a cláusula de barreira e vão se misturar aos outros. Então, para que misto? Vai direto para o puro. Pode começar pela eleição para vereador em 2008.
Há quase 2 anos, o filósofo Hélio Schwartsman publicou um editorial intitulado "Da Reforma Política". Schwartsman demonstrou preocupação sobre o voto distrital citado por FHC. Segundo suas próprias palavras: "muitos defendem a adoção do voto distrital misto para legislativas, mais ou menos nos moldes em que existe na Alemanha. A idéia é manter parte do sistema como é hoje, proporcional, mas criar também distritos onde candidatos ligados àquela região se enfrentariam disputando diretamente a preferência do eleitor. A idéia aqui, inatacável, é aproximar mais representantes de representados.O problema do voto distrital, puro ou em combinação com o proporcional, está na definição dos distritos que nunca é neutra, mas invariavelmente beneficia alguém. O rico idioma inglês até conta com uma palavra específica para designar a criação arbitrária de distritos eleitorais com a finalidade de fazer alguém ganhar e outrem perder. É a palavra "gerrymander" formada a partir do antropônimo Elbridge Gerry e do substantivo salamandra. Elbridge Gerry foi um governador de Massachusetts do início do século 19 que usou e abusou do redesenho de distritos. A adoção do voto distrital também tenderia a dificultar a eleição de parlamentares mais ideológicos ou de lemas específicos, como o da saúde, da educação ou dos direitos de minorias, e a favorecer candidaturas mais clientelistas, que procuram principalmente resolver problemas do distrito."
O debate sobre a Reforma Política já existe de longa data e, embora todos pareçam favoráveis ao assunto, nada acontece. Enquanto isso, somos obrigados a conviver com notícias como esta que saiu hoje, dia 21 de agosto de 2006: "Parlamentares sanguessugas têm até a meia-noite de hoje para renunciar". Parlamentares estes, que estão sendo abandonados pelos partidos -especialmente por ser ano eleitoral. No entanto, como eu já mencionei anteriormente, algumas decisões não são fáceis. Embora a reforma política seja necessária, é preciso que haja liderança para fazê-lo, ou, como o próprio Schwartsman disse: "Meu único receio é o de que estejamos empunhando a bandeira da reforma sem uma apreciação mais cuidadosa de suas implicações. O mais provável é que o redesenho das instituições políticas apenas nos leve a trocar dificuldades velhas por novas. Às vezes, isso pode até ser uma solução, mas na maioria das vezes não passa de um embuste."
Leia íntegra da matéria de Hélio Schwartsman em:
Leia íntegra da entrevista de Fernando Henrique Cardoso à Revista Época em:
2 comments:
O duro é ter que esperar uma crise para se fazer alguma coisa...
Cláudia, tenho ouvido muito sobre a reforma política e convocação de uma assembléia constituinte assim que o novo governo seja eleito. Penso hoje, quem irá aprovar as reformas políticas? Serão aqueles que já estão no governo, nos sugando a cada dia? Se forem estes, sabemos que a reforma tenderá a beneficiá-los e não o contrário. Sabe, outro dia, estava lendo sobre a China (mais uma vez...) em que os políticos, mesmo que possuem divergências, tem como objetivo maior o bem de sua Nação. Logo, se esforçam para que as coisas aconteçam... Mas voltando ao planeta Terra, Brasil, quero muito que esta reforma ocorra e quantas mais necessárias para o bem de nossa Nação.
obs: Os artigos em anexo também são muito bons :)
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